A Ferraton está situada na vila de Tain l'Hermitage, no norte do Vale do Rhône. Jean-Baptiste explicou que a história da empresa vem de um projeto familiar de 1907, mas que só virou marca própria após a Segunda Guerra Mundial, com Jean Orëns Ferraton, e seu filho Michel. Antes disso, o vinho era vendido em tonéis para outras empresas que o revendiam sob suas próprias marcas. No entanto, desde 1998 a marca pertence a Michel Chapoutier, grande nome dos vinhos da região. Sob seu comando, e a exemplo de outras propriedades de M. Chapoutier, todos os vinhedos da Ferraton foram convertidos em cultivo orgânico, e posteriormente, biodinâmico.
Além de apresentar a vinícola e os vinhos, o Mr. Ancelot também aproveitou para dar uma aula sobre a região do Rhône em geral, e em particular nas regiões dos vinhos apresentados. A área vitivinícola do vale do Rhône é subdividida em norte e sul, com aproximadamente 120Km de área montanhosa separando uma região da outra, resultando em terroirs muito distintos.
As DOCs do sul
No sul, em uma área cultivada total de 9725ha, o clima tem mais influência do mediterrâneo, com invernos mais amenos, e verões mais quentes. A principal uva é a Grenache, mas que divide terreno com diversas outras, entre as quais Syrah, Mourvèdre, Cinsault, Grenache Branca e Clairette. Desta região, provamos os seguintes vinhos:- Côte du Rhône Samorëns branco 2010: um vinho fresco, despretensioso, feito para ser bebido jovem. De cor amarelo-esverdeado bem pálido, com aromas frutados pouco intensos. Na boca, apesar da alta acidez, inicia adocicado (mesmo sendo um vinho seco), em seguida passa para um leve amargor, e termina esquentando a boca. O aroma não persiste muito no palato, mas na taça permaneceu com o aroma fresco até o fim da degustação.
- Les Lauses Tavel rosé 2010: A DO Tavel é exclusiva em rosés, mas em um estilo completamente diferente dos rosés da Provence. Passa por maceração por 24 horas, para se obter uma cor muito mais intensa, e é mais similar a vinhos tintos que a rosés, a ponto de ser confundido com eles, em degustações a olhos cobertos. Este exemplar, o primeiro Tavel que provei na vida, não me impressionou, por ter baixa intensidade aromática, e uma doçura que aparece no final de boca. (Uma hipótese levantada por um dos presentes é de que tenha ficado apagado por ter sido degustado após o Hermitage branco, que descrevo mais abaixo, na seção de vinhos do norte.)
- Plan de Dieu Côtes du Rhône Villages 2009: vinificado em tanques de concreto, e sem nenhuma passagem por carvalho, tem cor rubi de intensidade média, aroma de frutas negras frescas, com acidez média/alta e taninos suaves. Exceto pelo fato de sobrar um pouco de álcool no final, é fácil de harmonizar com pratos de sabores não muito intensos, de peixes a carnes, passando pelas massas.
- Le Parvis Châteauneuf du Pape 2007: a 'cereja do bolo', do sul do Rhône, é feito com 90% Grenache e - de acordo com o representante da vinícola - seguindo o estilo da denominação nos anos 60 e 70, apresentando uma intensidade de cor levemente mais baixa que outros rótulos da mesma DOC dos dias de hoje. Ainda assim, tem cor rubi de intensidade média, ligeiramente maior que o Villages. Com 12 a 15 meses em madeira, parte em barricas e parte em tonéis, ainda é jovial, com aromas de frutas vermelhas, notas tostadas e de especiarias, taninos macios, equilibrado, e com boa persistência aromática.
Os vinhos do norte
As denominações de origem mais conceituadas ficam no norte do vale, onde o clima é continental, dominado pelo vento Mistral, com noites frias, e inverno rigoroso. Diferentemente do sul, só permite uma única uva tinta: Syrah. E entre as brancas, Viognier, Marsanne e Roussane. O total de área plantada não passa de 3555ha, ou um terço da do sul.- Le Miaux Hermitage branco 2009: 100% da casta Marsanne, passa de 10 a 12 meses (dependendo da safra) sobre as borras em tonéis de carvalho de 600 litros, para ter um contato com madeira mais sutil. Destacaram os aromas de caramelo e frutas maduras, enquanto na boca se mostrava um pouco mais adocicado, com aromas resinosos e minerais, com equilíbrio entre álcool e acidez, grande persistência aromática, e um final de boca levemente 'salobro'. Ideal para acompanhar queijos franceses.
- L'Églantine Côtes-rotie 2007: esta denominação tradicionalmente agrada o gosto feminino, com a uva Syrah apresentando aromas de especiarias doces e taninos muito redondos. E esta característica em geral é reforçada pelo acréscimo de 20% de uvas brancas (Viognier) que a denominação permite. No entanto, este exemplar degustado é 100% Syrah, uma tendência criada por M. Chapoutier. O vinho era um rubi intenso com reflexos castanhos. Predominava o aroma da baunilha, com um fundo de frutas vermelhas frescas. Apresentava uma boa acidez, taninos discretos, e álcool equilibrado.
- Les Dionnières Ermitage 2007: custando a 'bagatela' de R$480, este vinho tinha que ser mesmo o melhor da noite. Um single vineyard (do vinhedo de Les Dionnières), com vinhas de 30 anos de idade, que passou de 14 a 18 meses em barris, sendo apenas 20 a 30% barricas de primeiro uso. Com cor rubi média/alta, grande intensidade aromática, com destaque para os empireumáticos e especiarias doces. Na boca apresentava frescor, com boa acidez e aromas de frutas vermelhas frescas, taninos macios, álcool equilibrado, e grande persistência aromática. Ainda muito jovem, a recomendação é de que seja decantado por pelo menos 3 horas, antes de ser servido.
Ao final da degustação, como de costume, passamos a outro espaço onde foi organizada uma pequena confraternização, onde pudemos interagir com os representantes da importadora, da vinícola, e os outros presentes, ao mesmo tempo em que podíamos apreciar mais um pouco dos vinhos, de forma mais descontraída.
Curiosidade: Hermitage, ou Ermitage?
A Ferraton apresentou na noite um Hermitage branco, e um Ermitage tinto. Ao ser indagado a respeito das diferentes versões de escrita, Jean-Baptiste explicou que:- As duas ortografias estão corretas, sendo que a forma original, em francês, é Ermitage. No entanto, pela influência do comércio com a Inglaterra, no século XIX, a versão 'inglesa' do nome foi incorporada ao francês.
- Havendo as duas formas, alguns produtores optaram por utilizar a forma 'tradicional' em seus vinhos single vineyards, como forma de dar mais destaque a eles. E para as suas linhas regulares, utilizam a versão com 'H'.
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