2 de outubro de 2013

Vinhos suíços Maître de Chais

Sempre que ouvi falar de vinho da Suíça, ouvi dizer junto que os vinhos são excelentes. Que se não são conhecidos fora do país, é porque os suíços têm dinheiro, e compram o vinho quase todo, sobrando muito pouco para exportação. Aliás, eles consomem 3 vezes mais do que produzem, sendo grandes importadores. Apenas 2% da produção (de 100 milhões de litros) seria destinada à exportação.

Recebi estes rótulos pelo clube Winelands. São todos tintos, da Apelação de Origem Controlada Valais. Eles foram produzidos pela Provins, uma cooperativa do Cantão de Valais, que processa as uvas de mais de 4000 sócios e outros viticultores da região. É um grande produtor, responsável por 10% da produção do país (segundo dados da própria empresa).

Lamentavelmente, os rótulos enrugaram na minha adega

Apresentação dos vinhos

Os três vinhos são da linha Maître de Chais. Consultando todo o catálogo da empresa, não se trata de uma linha básica. Estão entre os mais longevos da empresa, e seus preços são intermediários. De acordo com o catálogo, são vinhos para 'conhecedores', 'a mais premiada' e 'de classe internacional'.
    Humagne Rouge 2007: varietal com uma casta típica do país, a Humagne Rouge. Estagiou por 6 meses em tanques de inox. De acordo com as fichas técnicas disponíveis no site do produtor, é o vinho com menor durabilidade dentre os três, com 6 a 10 anos. Está, portanto, no momento ideal de consumo. (13,5% a.b.v.)
    Syrah 2007: outro varietal, desta vez com a famosa Syrah. Passou por 15 dias de maceração, estagiou 18 meses em barris de carvalhos novos, e o produtor recomenda de 10 a 15 anos de guarda. (14% a.b.v.)
    Rouge d'Enfer 2007: um corte com as duas primeiras (Syrah, Humagne Rouge) e outras duas variedades autóctones: Cornalin e Diolinoir. Cada uma delas é vinificada separadamente, e envelhecida em barris separadamente (12 meses, barricas de primeiro uso), de forma que o corte ocorre apenas na hora do engarrafamento. (14% a.b.v.)

Catacterísticas das uvas suíças

A Syrah dispensa apresentações, mas as uvas suíças são grandes desconhecidas para nós (e para quase todo o mundo). Abaixo descrevo as principais características, de acordo com o site do produtor, e do catálogo de uvas da Wine Searcher.
    Humagne Rouge: é provavelmente original do Vale d'Aosta, no norte da Itália. Chegou perto da extinção, antes de ser adotada na região de Valais. Gera vinhos rústicos, com pouca cor, e taninos acentuados. Os aromas característicos são herbáceos, terrosos e especiados.
    Diolinoir: esta é uma variedade criada na década de 1970, do cruzamento de outra uva suíça (Rouge de Diolly) com Pinot Noir. Tem estrutura, taninos e matéria corante acima da média, porém o sabor é neutro. É popular por ser resistente a doenças, mas é normalmente destinada a cortes.
    Cornalin: é uma das variedades mais antigas de Valais. É vigorosa, de amadurecimento tardio, exigente, e difícil de trabalhar. Contribui com níveis de açúcar e acidez, e suporta bem envelhecimento em garrafa.

Humagne Rouge 2007 na taça

Notas de cata

Ao pesquisar sobre os vinhos na página do produtor, o termo 'classe internacional' me deixou um pouco preocupado. Este termo, para mim, soa pejorativo. Em primeiro lugar, eu prefiro vinhos autênticos, com caráter, que se distinguam da maioria. Em segundo, associo o termo 'vinhos internacionais' aos vinhos excessivos, 'parkerizados': excesso de cor, excesso de álcool, excesso de madeira... No entanto, para minha felicidade, não foi esta a opinião que tive dos vinhos.
    Humagne Rouge 2007: cor granada de intensidade média, halo aquoso já bem nítido. Parecia até que o vinho tinha passagem por madeira: tinha aromas balsâmicos, de azeitona preta, terra úmida, muita pimenta, e um pouco de frutas em segundo plano. Apesar da cor mostrar evolução, inicialmente não apresentava aromas terciários nítidos. Acidez boa, corpo médio, taninos médios, na maioria finos, mas que vez ou outra, amarravam um pouco. Acontece que tomei apenas metade da garrafa no primeiro dia, e no dia seguinte, o vinho tinha evoluído muito bem. Ele ainda apresentava os aromas herbáceo, de terra e especiarias, mas a fruta (uva passa) apareceu com maior nitidez no retrogosto, garantindo longa persistência. Se eu soubesse, teria deixado aerar no decanter, ainda no primeiro dia.
    Rouge d'Enfer 2007: mesma tonalidade de cor, porém mais intensa, transparecendo a idade, mas demonstrando que seria um vinho mais encorpado. Pela experiência que tive com o primeiro, e considerando as características deste (mais longevo), eu já estava preparado para deixá-lo no decanter por um tempo. Só pra conferir, servindo-me de uma taça antes de deixá-lo aerar, verifiquei que estava fechado no nariz, e com predominância de couro na boca, além de áspero e com acidez desequilibrada. Foram necessárias duas horas para que ele se mostrasse redondo, e com aromas muito mais agradáveis, destacando as especiarias, folhas secas, leve tostado, e frutas maduras. Um terço da garrafa passou pelo decanter, e foi consumido na mesma noite. O restante se beneficiou do contato com o oxigênio dentro da garrafa, e no dia seguinte, estava ainda melhor: mais aromático, mais macio. Porém, não tão evoluído quanto o primeiro.


Os vinhos não haviam sido importados pela Winelands. Na realidade, já estavam no mercado brasileiro havia alguns anos, trazidos pela importadora Vinitude (à época chamada Vitis Vinifera). Aparentemente, estavam encalhados. Acho que o preço de R$119,00 com que estavam sendo vendidos era alto demais, mas os R$46,00 por garrafa - que paguei pelo clube - fazem jus ao preço. Pelas duas garrafas que provei, vejo que precisaram de uma boa oxigenada, horas, talvez um dia, de aeração para atingirem o auge. Por isso, a terceira garrafa, vou guardar, e esperar amadurecer lentamente.

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