A diversidade dos vinhos de Jerez é impressionante. Falando apenas dos generosos (secos), de um lado temos os Finos, e de outro, diametralmente oposto, há os olorosos. Ambos são fortificados, muito secos, feitos a partir da mesma variedade de uva (a Palomino). Mas são completamente diferentes entre si.
Diferentemente dos Finos, com sua crianza biológica, os olorosos são envelhecidos em uma crianza oxidativa; ou seja, em intenso contato com o oxigênio. Este processo não é uma exclusividade de Jerez. Diversos outros vinhos fortificados passam pelo mesmo processo, em todo o mundo (Porto Tawny, Marsala e Madeira são os exemplos mais famosos). Os Olorosos são um pouco mais peculiares por serem completamente secos: você sente aromas que lembram vinhos doces, mas na boca ele tem zero de doçura. Chega até a ser meio salgadinho.
Direto da Inglaterra
O melhor lugar para se comprar Jerez fora da Espanha é a Inglaterra, que é a maior consumidora deste tipo de vinho. E foi lá em Londres que comprei uma garrafinha de 375mL do Williams & Humbert Oloroso Collection 12 years, pela bagatela de £5,69 (uns R$22,00, pelo câmbio do dia). Aqui no Brasil, a primeira dificuldade é achar vinhos de Jerez, e se achar, um de 12 anos vai custar facilmente mais de R$200.A conexão entre os Jerez e a Inglaterra data de séculos, e devido ao sucesso do vinho em terras anglo-saxônicas, os sobrenomes ingleses são regra entre as empresas da região. Um exemplo está no produtor deste vinho: Williams & Humbert. E apesar dos sobrenomes de dois negociantes ingleses que fundaram a empresa, a marca já passou pelas mãos de uma multinacional holandesa, mas desde 2005 está nas mãos de um grande grupo espanhol. A Williams & Humbert sozinha possui 350ha de vinhas, e uma bodega de 180.000m2, o que a coloca como a maior da Europa.
O Oloroso
A cor do vinho é âmbar de intensidade média. O aroma é intenso (como o nome sugere), oxidado, com destaque para amêndoas torradas. Ele é encorpado, e pesa na boca. O álcool é bem presente, mas é preciso ser servido frio, à temperatura da geladeira. Mesmo assim, o álcool ainda é bem presente: creio que é preciso um parâmetro distinto para julgar o álcool desses vinhos. Afinal, são fortificados, e sem açúcar que possa suavizar o álcool. Apreciando-o como algo sui generis, é agradável, de sabor intenso, longo, e o final traz até uma pontinha de doçura.Uma das sugestões de harmonização dada pelo Conselho Regulador de Jerez para o Oloroso é guisado de carne. Ótima deixa para a Thais preparar o beef and Guinness stew (guisado de carne com Guinness, prato típico da Irlanda).
Este guisado é composto de carne cortada em cubos, lingüiça, e vegetais, como batatas, cenouras, e talos de salsão. O tempero foi composto de alho, sal, sementes de coentro, e pimenta do reino. No preparo, a carne deve ser temperada e selada. Depois, deve-se acrescentar a água e os vegetais picados. Quando os vegetais já estão cozidos, e a água reduziu bastante, joga-se a cerveja, e cozinha por mais uns poucos minutos, para ela se integrar ao restante. Eles costumam comer com purê de batatas, mas no nosso caso, comemos junto de arroz branco e uma salada de folhas.
Os vinhos de Jerez são considerados gastronômicos, vinhos que harmonizam com comidas difíceis. Mas a minha experiência com eles não tem mostrado isso. Este ano, tentei diversas harmonizações com os Finos (aqui e aqui), mas a maioria não deu certo.
Dessa vez, pelo menos, o Oloroso não sumiu com a comida. Tampouco atropelou o guisado. O problema para mim é que o vinho é muito corpulento, muito alcoólico; e como o prato também é meio pesado, a soma dos dois acabou resultando em uma experiência pesada demais. Tem gente que acha que isso é uma boa harmonização, eu nem tanto. Se a comida me dá vontade de parar de beber, então é porque não está dando certo.
Creio que este vinho vai melhor como aperitivo, mesmo. Antes do almoço, nós bebericamos o vinho com pedaços de queijo grana padano, e com amêndoas torradas (a quintessência da harmonização por semelhança), e ele se saiu bem melhor do que com o guisado.
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