Os vinhos de Jerez são um mundo de extremos. De um lado, os super secos - que ocupam por si só um amplo espectro de estilos, do Fino ao Oloroso - são muito celebrados, aclamados por especialistas e apreciados por habitués. O PX, por sua vez, é o extremo oposto, super doce, provavelmente o vinho mais doce do mundo; mas é igualmente badalado e apreciado, tendo exemplares caríssimos. Só o meio termo - o grupo dos Jerez Cream - é sempre desdenhado por especialistas, apesar de ter seu público cativo.
O PX, ou Pedro Ximénez, é o nome da casta e do estilo. Esta variedade, em Jerez, sempre é usada para produzir este estilo super doce. As uvas são colhidas e colocadas para desidratar ao sol, para concentrar açúcares e sabor. Quando são prensadas, geram um mosto muito denso, muito doce - um xarope - que é então colocado para fermentar. A fermentação alcoólica, em geral, produz muito gás carbônico, e o vinho fica borbulhando intensamente, como se estivesse a ferver. No entanto, no PX, quando a primeira bolhinha de gás se desprende do mosto, o enólogo adiciona uma grande quantidade de aguardente, para interromper a fermentação.
Acho que o único motivo de esperarem a primeira bolha de gás da fermentação é para poderem chamá-lo de vinho (pela lei, suco de uva com álcool se chama mistela; pra poder ser vinho tem que ter tido fermentação, nem que seja parcial). Afinal, todo o álcool presente no vinho foi adicionado. Além disso, todo o açúcar da uva passa continua no vinho. E estamos falando aqui de concentrações que facilmente passam os 400 gramas por litro. Ou seja, mais de três vezes mais doce que um vinho do Porto típico.
Esta descrição dos métodos de produção nunca me entusiasmaram muito. Mas como disse, estes são vinhos celebrados, aclamados. Há exemplares com idade de 10, 20 anos ou mais, que podem custar caro.
O cadeado
Entre a curiosidade e a hesitação, encontrei uma promoção na importadora Zahil, pelo Dia do Jerez, do El Candado Pedro Ximénez por R$118. Busquei, e encontrei vários comentários elogiosos a ele, e por isso, arrisquei. A propósito, Candado significa cadeado, e a garrafa vem com um cadeadinho estiloso travando a tampa, para dizer que está guardando um líquido precioso.Fiquei esperando uma oportunidade para abrir o vinho, até que tivemos um aniversário de dois amigos da Nossa Confraria. Em turma de vinho, a festa é com vinho, e porque não, com bolo de aniversário? Seria um bolo de nozes e ameixas, e me pareceu que tinha tudo a ver com o PX. Me enganei.
Após os parabéns, enquanto os aniversariantes cortavam o bolo, eu destrancava a garrafa, e servia a todos. O líquido que escorria para as taças era viscoso, e de uma cor castanha muito escura, quase como café. O aroma parecia ter tudo a ver com o bolo, e o vinho exalava muita ameixa seca, nozes, amêndoas, e caramelo. Mas na boca, era tão doce, que chegava turvar a vista. O álcool (18%) não chega a aparecer devido a tanto açúcar, e a acidez então, é como se não houvesse nenhuma. A primeira golada, não acreditei, esperei passar o susto inicial, e tentei outro gole. Um terceiro, com o bolo. Realmente, tinha chegado no meu limite. Era enjoativamente doce. Só me restou concordar com a opinião de todos, tomar um copo de água para tirar o xarope da boca, e me servir de um Porto Tawny, para acompanhar o bolo. Assim como fizeram os outros.
Neste momento, a Zahil está vendendo este vinho por R$256, então poderia-se pensar que comprei com um descontão. Mas não só o vinho desagradou fortemente, como também não vale tudo isso. É possível encontrá-lo na Europa por valores entre €10 a €12, portanto creio que a importadora está com margem de lucro gorda demais.
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