Os vinhos laranjas, como já sabemos, têm sua origem associada à Geórgia, a república caucasiana, à margem do Mar Negro. Este estilo de vinificação - em que as uvas brancas passam por longa maceração com as cascas, em recipientes de barro chamados kvevri - existe há provavelmetne 8000 anos, e nunca deixou de ser usado no país.
Vinhos neste estilo são produzidos grosso modo em todo o pais. Mas a região de Kakheti começa a ganhar projeção internacional devido ao seu protagonismo. Localizada no extremo leste do país, Kakheti é responsável por 70% da produção vinícola da Geórgia. Os vinhos em kvevri não são exclusivos da região, e nem todos os vinhos de lá são produzidos assim; de qualquer forma, seu nome tem sido associado a vinhos laranjas fermentados em kvevri, principalmente quando são feitos a partir da variedade Rkatsiteli. É o estilo Kakhetiano.
A Rkatsiteli (რქაწითელი, em georgiano), cujo nome significa pedúnculo vermelho, é a segunda variedade mais cultivada da Geórgia, perdendo apenas para a Saperavi. Possivelmente cultivada por milênios no Cáucaso, durante o período soviético ela se disseminou pelos países ao redor do Mar Negro, como Ucrânia, Romênia, Moldávia e Bulgária. A vinha é resistente a invernos rigorosos, e gera uvas com alta acidez e teor de açúcar, além de aroma de frutas brancas e flores. A alta acidez lhe faz perfeitamente adequada à tradicional vinificação em vinho laranja típica de Kakheti, que resulta em um vinho com grande complexidade.
A Shabo, uma das maiores vinícolas da Ucrânia, tem proprietários de origem georgiana, e aproveita para celebrar a sua origem produzindo um vinho laranja, ao melhor estilo kakhetiano: trata-se do Shabo Rkatsiteli Kakhetian Type 2011. Na sua produção, as uvas Rkatsiteli passam por maceração durante 9 meses em kvevris, que ficam enterrados no chão, apenas com a boca pra fora.
O vinho tem uma cor acobreada, entre o âmbar e o alaranjado, de alta intensidade. O aroma traz a complexidade esperada do estilo, com casca de laranja, mamão, manga, damasco, flores, amêndoas e avelãs. Em parte, me lembrou um pouco um Torrontés, mas com muito mais complexidade. Na boca, é bem melhor que o Torrontés, seco, com corpo médio, acidez equilibrada, álcool discreto, leve adstringência e amargor, e média persistência.
Conforme comentei no mês passado (veja aqui), tenho testado harmonizações com vinhos laranjas. Desta vez, fui mais ousado, e levei este vinho ao Lagundri, restaurante de comida tailandesa, que já comentei algumas vezes aqui no blog. Ele acompanhou muito bem o Mie Goreng, prato a base de bifum (noodles de arroz), preparado na wok com amendoins, legumes, curry e camarões. Acho que a complexidade do vinho laranja casou muito bem com as especiarias do prato, com ambos se complementando em algo mais. Além disso, o Shabo Rkatsiteli, com seu teor alcoólico mais baixo (12%), não brigou com a pimenta, e até o seu leve amargor desapareceu com a comida. Se a tentativa do mês passado tinha sido apenas ok, dessa vez, o resultado foi excelente.
Os vinhos da Shabo, incluindo este laranja, são importados pela Winelands.
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