De uma lista de mais de 20 castas outrora comumente utilizadas na produção de Vinho Madeira, muitas caíram em desuso ao longo do Século XX. Algumas castas anônimas, cultivadas em quantidades minúsculas, ainda entram em lotes de vinhos sem denominação de casta; outras teriam sido mesmo extintas. É o caso da Bastardo.
A Bastardo é uma variedade razoavelmente comum em Portugal continental, mesmo sem ser predominante em nehum lado. É encontrada principalmente como coadjuvante na região do Douro, mas também se encontra em vinhas velhas pela Beira Interior, Bairrada e Dão. Segundo o livro de Jancis Robinson, é cultivada em Portugal ao menos desde o Século XVIII, mas sua origem é a França, mais especificamente a pequena região do Jura, onde é conhecida pelo nome de Trousseau.
É uma variedade que demanda muito trabalho no cultivo, muito suscetível a doenças fúngicas. Provavelmente por isso tenha sido preterida na Madeira, apesar do potencial de vinhos com alto teor de açúcar, longa capacidade de guarda. Mas vê um renascimento nas mãos da Barbeito, um dos produtores com maior reputação quanto à qualidade dos vinhos produzidos.
Não sei se houve alguma outra empresa na Madeira a vinificar Bastardo em em varietal neste século, mas de certeza a Barbeito foi a única a comercializá-los, com 3 rótulos diferentes, Duas Pipas Reserva (5 anos), Três Pipas Reserva Velha (10 anos), e Quatro Pipas Reserva Especial (também 10 anos), todos meio secos. Segundo consta no contra-rótulo das garrafas, a Bastardo estava extinta da ilha, até que um dos viticultores que trabalham em parceria com a Barbeito (as vinícolas na Madeira raramente possuem vinhedos, as uvas são quase na totalidade compradas de viticultores locais) decidiu replantá-la em 2004, rendendo a primeira colheita em 2007.
A cada colheita, ele fez experimentações na vinificação, para estudar como se comporta a casta. E posteriormente, fez blends com as pipas (barris) em que envelheciam esses vinhos. No vinho da foto, o Bastardo Três Pipas Reserva Velha, o blend conteve uma pipa de 2009, uma de 2010, e uma de 2011 (daí o nome). Em seus experimentos, 2010 foi vinificado com curtimenta (ou seja fermentou com as cascas), enquanto os outros dois foram vinificados em bica aberta (fermentado sem a presença das cascas). Sempre, envelhecidos em canteiro.
A vinha de onde provém as uvas está plantada na costa norte da ilha, próxima à localidade de São Jorge. A costa norte tem temperaturas mais amenas, o que resulta em uma maturação mais lenta, que conserva maior acidez. Esta característica está em consonância com o estilo da Barbeito, cujos vinhos têm um perfil mais fresco e elegante.
O vinho tem cor âmbar, brilhante e de média intensidade. Os aromas, um pouco mais comedidos que outros vinhos Madeira, trazem o típico perfil terciário de vinhos feitos com envelhecimento oxidativo intenso, com frutas secas (em especial tâmaras), geléia de damasco (mostrando o lado mais fresco dos vinhos deste produtor), amêndoas torradas, caramelo - enfim, aquele tal bolo de frutas inglês - além de um aroma químico de verniz que aparece em exemplares mais velhos. O vinho tem 64g/L de açúcar residual - ou seja, próximo do limite inferior da categoria meio seco. Somado à boa acidez, deixa o vinho mais fresco, mais elegante. É um vinho de corpo médio, com uma intensidade média+, porém com alta persistência, e deixa a boca fresca.
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